Dias Mortos

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Mais um texto de Pedro.
Obrigado pela colaboração, o texto está ótimo, com extremas doses de sentimento.
Escrever é realmente bom, e eu continuo acreditando.
Naquela sexta-feira se completava exatamente uma semana do ocorrido...
"Eu estou com outra pessoa, acho que isso define as suas chances". Essa frase martelava em sua cabeça incessantemente durante esses dias. E nada que fizesse ou pensasse tirava isso de sua mente. Já não estavam mais juntos havia cerca de um mês, mas ele jamais havia perdido a esperança de estar com ela novamente. Até aquela sexta...
Não era difícil de se imaginar que ele fosse ficar assim. Nunca tinha tido por um sentimento tão forte e tão intenso por alguém em 21 anos de vida. E, diferentemente de outras vezes em sua vida, foi um sentimento que aflorou, que teve correspondência. Por um curto espaço de tempo, mas teve. Mas agora não havia mais ela para ele poder liberar e compartilhar esse sentimento. Durante toda sua vida recusou empregar a palavra "amor" em um relacionamento que tivesse vivido, mas pela primeira vez a usara. Pois sabia que o que sentia por ela - e que na verdade ainda sente - era amor. No tempo que esteve com ela era como se estivesse num universo à parte: um universo colorido, vivo, intenso, sem problemas, sem a correria do dia-a-dia, sem frustrações ou tristezas. Um lugar que ele jamais queria sair. E agora acordava todo dia sentindo algo dentro de seu peito arder, e sabia que esse ardor era a vontade de tê-la por perto. Ainda podia sentir nas mãos a textura e o toque suaves da pele dela, assim como sentia perfeitamente o corpo esguio e curvilíneo colado com o dele. Quando fechava os olhos ainda sentia aqueles lábios tocando os seus, numa sensação que ele nunca iria esquecer. A atmosfera que ela criou naqueles momentos em que estiveram juntos era algo único, que ele sabia que de maneira alguma teria com outra pessoa no mundo, senão com ela.
O olhar que tinha, antes atento e fixo, agora era perdido, distante, e o brilho que o par de olhos claros tinha agora havia se tornado opaco, quase fosco, como se não tivesse mais vida. O cabelo, outrora bem-penteado e sempre cortado agora estava grande, desgrenhado. E a barba, antes sempre feita, agora crescia, lhe dotando de uma aparência desgastada e desleixada. Uma mostra de que o cuidado, ainda que simples, com seu visual - algo comum na sua vida - se fora. Não tinha mais uma boa razão para ter esses cuidados. Se ela não estava mais com ele, não tinha porque se preocuar mais com isso. O mesmo se valia para o que vestia. Pra que escolher a dedo o que usar, se não havia mais ocasiões que ele fosse precisar se arrumar? Até mesmo os perfumes, itens antes indispensáveis para ele, agora não passavam de meros enfeites no móvel do seu quarto.
Os dias, desde então, se tornaram todos iguais. Se sabia que dia da semana estava, era por conta de algo que via na televisão, ou pelo dia ser feriado, como foi no meio da semana. Pouco importava agora se era uma segunda-feira ou um sábado, todos os dias agora tinham o mesmo tom de cinza e a mesma falta de vida. 24 horas, que antigamente pareciam muito pouco tempo para o que fazia durante o dia, agora pareciam um tempo demasiadamente massacrante, que nunca terminava. Acordava e fazia o que tinha que fazer apenas pensando que tinha que deitar e dormir para iniciar o outro dia, e assim por diante. Dias mortos enfim.
Nada lhe trazia algo que colorisse os dias. Mesmo que tenham havido inúmeras ocasiões durante a semana em que tenha tido a presença dos amigos, nada parecia mudar para ele. Se situou no tempo e no espaço - ainda assim em parte - apenas na quarta-feira, dia que além de feriado houve uma aula de música que ele tinha de repor. Recebera do professor um disco. Gostou do que ouviu, eram boas as músicas. Entretanto, logo uma das músicas que mais lhe chamaram a atenção pela melodia se chamava "Love Will Come Again" ("O Amor Virá Novamente"). "Pra mim não virá", pensou enquanto ouvia...
Na quinta tudo voltou a ficar como estava: cinza. Ainda assim ligou para uma amiga, a quem tinha como uma irmã de coração, perguntando se não queria ir junto com ele para a Universidade. Juntos foram, e no caminho tocou a música que ele havia gostado. Ela comentou do título e ele disse quase o mesmo que pensara no dia anterior. "Não acredito no que essa música diz". "Mesmo que você não acredite o amor voltará para você, pode apostar", essas foram as palavras dela. Silenciosamente ele pensou "queria saber de onde ela tira tanto otimismo...".
Não se viram mais naquela quinta. E no final do dia, ao se deitar para dormir, sentiu em sua cabeça um peso muito maior que o que vinha sentindo. Estava para fazer uma semana do ocorrido. A voz ficava cada vez mais alta, e aquela fora a pior noite de sono desde então.
Acordou na sexta e olhou todo o quarto ao seu redor. Demorou, ainda deitado, alguns minutos para saber em que dia estava, e quando se lembrou, o peso veio muito, muito maior dentro dele. Junto com o peso veio o mesmo ardor no peito, e todas as sensações que ele sabia que jamais teria novamente, senão com ela.
E assim viria mais um desses dias cinzentos que ele não sabia quando mudariam - se é que um dia mudariam! - na sua vida.
Dias cinzentos, dias mortos enfim.
Pedro Ivo
escrito ao som de 30 Seconds To Mars e Kanye West - Hurricane e MSTRKRFT - Heartbreaker

Comentários

  1. vc me descreveu em uma epoca!
    sei o q sente, mas garanto q passa!

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  2. Adorei o texto, me indentifiquei com alguns pontos mas ao contrário, acredito no titulo da canção, pelo menos pra mim, em minha vida, acredito que o amor acontecerá novamente, pois, se um dia eu perder essa esperança, aí sim eu posso acreditar que morri! A esperança de amar nos faz viver e não permite apenas que fiquemos sobrevivendo. O mundo parece pequeno em alguns momentos, mas ao levantarmos a cabeça e olharmos para frente, além do nosso nariz, vemos que os nossos olhos não dão conta da imensidão e que a experiência dos nossos vinte e poucos anos não são nada, não percorreram nem um milésimo do que se há, se pode e se deve viver! "O mundo é bão Sebastião!".
    Texto profundo.
    Gostei do que encontrei por aqui!

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